23 dezembro 2011

19 dezembro 2011

Quantas mais pessoas ou quanto mais pessoas?

Hoje, a propósito de um anúncio que ouvi na rádio, pareceu-me que esta seria uma interessante pergunta para colocar aqui. Mais do que escolher, importa saber por que motivo uma das construções é preferível...

Quantas mais pessoas vierem à festa, melhor.

ou

Quanto mais pessoas vierem à festa, melhor.

?

14 dezembro 2011

Anticonstitucionalissimamente

Afinal, aquela palavra que por vezes ouvimos dizer que é a mais comprida, ou das mais compridas em português, anticonstitucionalissimamente, é correcta ou não? E porquê?
Agradeço desde já as vossas respostas a esta "pergunta-desafio"! (Não se trata propriamente de uma pergunta retórica ou de uma dúvida existencial).

Uma pista: a resposta implica considerar o tipo de adjectivo que está na base do advérbio.

30 novembro 2011

SER ABUSADO, ainda e sempre…

A forma participial «abusado» só por si não constitui erro algum. Corresponde ao particípio passado de um verbo da primeira conjugação – ABUSAR. (Tal como: estudar – estudado; gostar – gostado; comprar – comprado; maltratar-maltratado, etc.).
Assim, é possível termos a estrutura composta TER ABUSADO, em construções participiais ativas como (1):

(1) Esse indivíduo tem abusado frequentemente dessas crianças.

O erro sintático prende-se com o uso do particípio «abusado» com o verbo auxiliar SER, em construções participiais passivas como (2):

(2) * Essas crianças têm sido abusadas frequentemente por esse indivíduo.

A frase (2) tem uma incorreção sintática, porque o verbo abusar NÃO PERMITE construções passivas. E porquê?
Porque é um verbo transitivo indireto, ou seja, é um verbo que é acompanhado de uma preposição.
Assim, verbos como CONVERSAR COM, OBEDECER A, GOSTAR DE, ABUSAR DE admitem apenas construções ativas e NUNCA PASSIVAS. Observem-se as seguintes construções passivas totalmente impossíveis em português:

(3) A Maria conversou com o Pedro.
(4) * O Pedro foi conversado pela Maria.
(5) O Pedro obedeceu aos pais.
(6) * Os pais foram obedecidos pelo Pedro.
(7) O Pedro gosta da Maria.
(8) * A Maria é gostada pelo Pedro.

Do mesmo modo, do ponto de vista sintático, não é possível termos a estrutura (10):

(9) O homem abusou da criança.
(10) * A criança foi abusada pelo homem.

Uma vez que não é legítimo o uso de passiva com este verbo, sugere-se o uso de perífrases, como (11):

(11) A criança foi vítima de abuso /maltratada/molestada/violentada.


Nota: O sinal * indica que a frase é agramatical, ou seja, incorreta do p.v. sintático.

16 novembro 2011

Quem tem e quem não tem medo de ter medo?

Na minha actividade enquanto docente, tenho concentrado boa parte do meu esforço pedagógico em ajudar os alunos a fazerem um percurso que os leve da inconsciência e da despreocupação face aos erros que cometem, na oralidade e na escrita, ao gosto pelo desafio que as situações do quotidiano lhes colocam, no que respeita à distinção entre o certo e o errado, a norma e o desvio.
Basicamente, tento levá-los a considerar que a forma como se fala e escreve é importante, e não indiferente, porque transmite uma imagem de nós que pode ser positiva ou negativa; e procuro transmitir-lhes a ideia de que, se tivermos consciência das nossas limitações e dificuldades, estaremos mais perto de as resolver e de melhorar o nosso desempenho. Explico-lhes, portanto, porque devem passar da atitude de “ah, eu nunca meto acentos” ou “eu nunca sei onde é que devo meter acentos” para a atitude de dizer “se há uma maneira de saber que palavras devem levar acentos e porquê, então eu quero saber qual é!”
Este caminho, que tento levar os alunos a percorrerem, através de actividades e exercícios sempre executados com bom humor e uma atitude essencialmente optimista, implica a passagem por um estádio intermédio – que tento que seja o mais breve possível –, que corresponde à fase em que, tendo tomado consciência da quantidade de erros que cometem, contrariamente ao que pensavam, os alunos têm medo. Medo de errar, medo de dizer ou escrever mal uma palavra ou uma frase, medo de passar a vergonha de assumir, perante si e perante os colegas, que afinal não usam correctamente a sua língua materna.
É uma fase que me faz pensar nas situações de perda, em que a dada altura se passa pela negação, pela incapacidade de aceitar a perda (neste caso, perda de confiança em si), porque muitos alunos demonstram certa falta de à-vontade perante o desafio de distinguir, por exemplo, entre o correcto e o incorrecto, ou perante a necessidade de confessar o desconhecimento do significado de certas palavras. Sentem-se inseguros, incapazes de acertar, e por isso, simplesmente, fazem outra coisa qualquer em vez de participarem na aula: mais ou menos discretamente, dedicam-se a estudar outra disciplina, a consultar o e-mail, a passar apontamentos. É como se assobiassem para o lado, escolhendo ignorar aquela oportunidade de melhorarem e voltarem a ganhar confiança na sua capacidade – não para não falhar, mas para aprender a evitar as falhas. Ora, o medo de falhar que cala e faz cruzar os braços é, como sabemos, o pior inimigo da aprendizagem – ou um inimigo pelo menos tão inconveniente como o orgulho em ser ignorante.
Foi da percepção deste medo que surgiu o título do nosso livro de exercícios (Quem Tem Medo da Língua Portuguesa?), que quisemos que soasse como um desafio convidativo, uma proposta lúdica. Não a concebemos apenas para os que conseguiram ultrapassar a fase da negação (ou para os que não passaram por ela, porque felizmente também há casos desses!), não é só para os que passaram a considerar cada exercício, cada teste, como uma excelente oportunidade para verificarem o que sabem e o que ainda não sabiam (e que  passarão rapidamente a saber), para os que respondem, sem hesitar: “eu não!”. O livro é também para os outros, para todos, porque com ele esperamos fazer surgir, ou estimular, o prazer de falar e escrever com correcção e rigor.





Nota: este texto não foi escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico porque não gosto dele e ainda posso fingir que não existe (estou em fase de negação, mas sem medo).

11 novembro 2011

premissas ou permissas?

Hoje venho fazer uma confissão: na aula passada, escrevi no quadro, sem pensar, "permissa".
Não tem desculpa nem perdão: se não temos a certeza de como se escreve, não devemos escrever. Muito menos num quadro de sala de aula, para todos os alunos verem e repetirem o erro, nos seus cadernos. Acreditem que me senti muito mal quando, horas mais tarde, houve uma luzinha de alarme que, muito atrasada, se ligou na minha mente. «Olha lá, não deverias ter escrito premissa?», perguntou-me um grilo falante que, na hora H, estava decerto, e infelizmente, a dormir.
O sobressalto foi atordoador. Senti uma náusea quase física. O mal estava feito. Raiva!
Desculpem o erro. E o desabafo. Todos.

02 novembro 2011

"Copydesk" por um dia - Parte I

Os textos seguintes são excertos de notícias de um órgão de comunicação social.
Faça uma revisão atenta a cada um deles e indique as incorreções linguísticas/ortográficas que detetar.


A.
"Nas operações realizadas no fim-de-semana, os elementos da PSP apreenderam 75 doses individuais de haxixe, nove máquinas de fortuna e azar, 1.847 CD´s e DVD´s falsificados, 54 peças de vestuário contrafeitas e 368 euros em dinheiro."

B.
"Quando o terceiro golo parecia eminente, o “capitão” Cristiano Ronaldo reduziu (90+2 minutos), na transformação de um livre direto, e Portugal ainda procurou o “milagre”, mas não chegou a criar qualquer oportunidade."

C.
"À DVC está associado um processo complexo, que na sua origem tem um ciclo vicioso entre a hipertensão e a inflamação venosa. "

D.
"Fonte da PJ disse à agência Lusa que a menina, com menos de 10 anos de idade, terá sido abusada num bar de uma coletividade que frequentava habitualmente, onde o suspeito trabalhava."

25 outubro 2011

Com ou 100 seguidores!


Com ou sem leitores "fidelizados", continuaríamos a escrever neste blogue, mas confesso que fico feliz com a constatação de que chegámos, lenta mas firmemente, aos 100 seguidores.

Claro que o número 100 tem apenas a aura de ser a primeira centena, é um cento fresco, redondo e certinho. Mas não é melhor do que 87, 99, 101, ou outro número qualquer.


Naturalmente, sejam quantos forem, quer voltem a abrir esta página, quer a vejam apenas uma vez, todos os leitores merecem a nossa atenção e o nosso agradecimento.


Porém, não há como evitar sentir esta ligeira e pueril euforia... Porque 100 é, de facto, um número bonito, quanto mais não seja por vermos nele um motivo para festejar!


Obrigada, sinceramente, aos (primeiros) 100 leitores que escolheram seguir-nos!

23 outubro 2011

Caça ao erro


Que erros gramaticais devem ser corrigidos nas frases seguintes?

1. Não há dúvida de que o curso trás conhecimentos fundamentais.

2. Algumas pessoas não têm o mínimo de informação à cerca deste assunto.

3. Os homens só se preocupam com ganhar dinheiro, nem que para isso tenham que haver guerras.

4. Sou monitora de ATL à quase dois anos e nunca senti necessidade de possuir uma licenciatura.

5. Se assim fosse, sentiriamo-nos bem melhor connosco próprios.

6. A notícia sobre este caso de pedófilia foi divulgada pelos orgãos de comunicação social.

7. Há certos conceitos que, para melhor os transmitir-mos, devemos compreender em profundidade.

8. A experiência, como é natural, adequire-se com o tempo.

9. É de referir os constantes sacrifícios a que as crianças são obrigadas nos dias de hoje. 


15 outubro 2011

O QUE SÃO E PARA QUE SERVEM OS CONECTORES?


Conector é uma designação genérica para as palavras ou locuções que servem para ligar ideias ou orações, permitindo construir frases complexas. Embora a conjunção seja a classe de palavras mais representativa desta função, também os pronomes, as preposições, os advérbios e até os verbos, para além da própria pontuação, servem para ligar orações.

Conjunções:
Rómulo de Carvalho é, ainda hoje, um conhecido poeta, professor e historiador, mas é pouco divulgada a sua faceta de pedagogo, embora sejam de grande interesse e enorme actualidade a maior parte dos seus diversos textos pedagógicos.

Pronomes relativos:
A facilidade das comuni­cações, que nos permite ter notícia, até simultânea, dos acontecimentos que se estão a passar em qualquer lugar do globo, tornam-nos comparsas de um espectáculo enervante no qual as múltiplas crises nos tocam, alarmam e deprimem. (adap. de Rómulo de Carvalho, “O estado actual do ensino da Física”).

Preposições:
Era um homem preocupado e atento às dificuldades sentidas pelos estagiários e professores, com perfeita consciência de que o Estado não cumpria a sua parte na eficaz organização e planificação do ensino, de acordo com as necessidades que eram sentidas por alunos e professores.

Advérbios:
Não estava satisfeito com a situação no país, talvez até tivesse contemplado a ideia de sair de Portugal, possivelmente leccionar em Inglaterra, entretanto o palco, por excelência, da aplicação de novos programas e novos métodos no ensino liceal.

Verbos (no gerúndio, particípio e infinitivo):
O professor terá sido um excelente examinador oficial, a avaliar pelos seus rigorosos critérios e grau de exigência, tendo sido o principal examinador estatal em Lisboa durante uma década, apreciados que eram os seus métodos de avaliação do desempenho de estagiários no ensino liceal.

03 outubro 2011

Tolerância de ponte ou de ponto?

Qual a expressão adequada: "tolerância de ponte" ou "tolerância de ponto"?
E porquê?

23 setembro 2011

Cuidado com as pesquisas :)

O Portal da Língua Portuguesa é uma base de dados de referência e um instrumento tão útil, que não imagino a minha vida sem ele. Não me canso de o recomendar e de louvar o trabalho da equipa que está por trás de tais conteúdos.
O seu vocabulário, porém, fornece apenas informação ortográfica e morfológica, pelo que gostaria de deixar aos leitores deste blogue, em especial aos meus alunos, duas recomendações:

a) tenham em conta que, por aparecerem duas palavras com grafias semelhantes, isso não significa que se trata da MESMA unidade lexical, com o mesmo significado. Por exemplo, o facto de constar ortiga e urtiga não quer dizer que o nome da planta se possa escrever de duas maneiras em português, pois ortiga significa também uma espécie de canhão.
Na verdade, é preferível, ainda hoje, escrever-se urtiga para designar a planta (do latim urtica), ainda que alguns dicionários já registem ortiga como variante ortográfica. O mesmo sucede com gás e gaz, chichi e xixi: estão lá ambas as formas, mas será que o significado é o mesmo? Só um dicionário nos pode esclarecer...


b) A divisão silábica apresentada para cada palavra é ORTOGRÁFICA. Isto significa que, se pretendemos saber como se divide uma palavra em sílabas fónicas, ou fonéticas, aquela base de dados pode não ser a melhor ajuda. Por exemplo, a palavra história aparece assim: his-to-ria. Ora, isto corresponde à divisão que se deve utilizar na translineação. Porém, na última sílaba (-ria) estão na verdade duas sílabas fónicas. Por isso, num manual de língua portuguesa do 1.º ciclo, por exemplo, história pode surgir como exemplo de palavra com 4 sílabas: his-tó-ri-a.
Acresce que a forma como partimos as palavras, quando as pronunciamos, pode variar consoante a velocidade de dicção (podemos dizer pi-a-no ou pia-no). Por outro lado, a translineação tem regras próprias que por vezes vão claramente contra a divisão silábica natural das palavras: por exemplo, partimos a palavra carro como car-ro, porque as consoantes iguais seguidas devem ficar separadas. No entanto, a partição fonética da palavra é diferente: [ka] [Ru] - ou seja, ca-rro.

Cuidado, portanto, com a forma como interpretam os dados disponíveis numa base de dados morfológica como a do Portal da Língua Portuguesa.
Espero que estas advertências sejam úteis e que tornem as vossas pesquisas ainda mais proveitosas!

20 setembro 2011

Ateéis e epimis

Sabem o que são "ateéis"?
Vários A.T.L.

As siglas são assim... achamos que se trata de um funcional conjunto de iniciais, sem direitos gramaticais, porque não são palavras a sério, e elas pregam-nos esta partida: põem na boca das pessoas um plural como deve ser, ou seja, flexionado de acordo com as regras da língua.
Se ATL ("á-tê-el") é uma unidade significante (e de que maneira! O que seria da maior parte dos pais e mães sem eles?!), um conjunto de sons verbais com tónica na penúltima sílaba e que termina em vogal + l - tal como papel, pincel e hotel - o seu plural, pois então, não deve ser A.T.L. (que não é plural nenhum), nem "A.T.L.'s", que soa a erro infantil, como "papeles" e "pinceles", mas "ateéis", como pincéis e hotéis.

E agora acrescento, depois de um prezado leitor me ter chamado a atenção para o facto de parecer que, no parágrafo anterior, eu defendo que o plural de ATL deve ser "ateéis": era a brincar, estava a ser irónica! Na verdade, as siglas não devem ser usadas no plural: o plural de ATL é ATL (repare-se que não há diferença nas iniciais entre Atelier/Ateliê de Tempos Livres e Ateliers/Ateliês de Tempos Livres).


E uma vez que acrescentei este aviso, posso agora perguntar: saben o que são "epimis"?
Essa ouvi ontem, com estes ouvidos que a terra (não) há-de comer: «dois epimis com bongos, nâguetes e cenoura», confirmou o funcionário da caixa de pagamento, depois de ouvir o pedido.
Já estão a ver o que são "epimis"?

Claro! É o plural de Happy Meal :)

18 setembro 2011

Aselhas e azelhas

Todos temos o direito de ser aselhas, de dizer disparates, de falar sem pensar, de cometer erros, de não conseguir fixar o que aprendemos e de esquecer o que tínhamos aprendido. É o direito de sermos humanos, afinal.
E quando teimamos no erro, quando nos recusamos a aprender, quando temos orgulho em sermos ignorantes... será esse também um direito nosso?




Claro que sim. Com uma diferença, que bem se vê.
É que, se assim formos, seremos mais aselhas do que os outros:
eternos "azelhas", teimando no z...

12 setembro 2011

Guarda-chuvas, guarda-redes e guardas-mores... porquê?

O plural dos nomes compostos cujo primeiro elemento é a palavra “guarda” não se forma sempre da mesma maneira, ao contrário do que poderíamos pensar.

Se “guarda” é verbo, este termo não muda, pelo que o plural afecta apenas o segundo elemento do composto (e assim temos guarda-chuva/guarda-chuvas, guarda-cama/guarda-camas, guarda-roupa/guarda-roupas).

Porém, a palavra guarda pode ser um nome (ou substantivo). Isto significa que ela poderá ser flexionada no plural. Isto acontece nos compostos cujo segundo elemento é um adjectivo (que está precisamente a qualificar o nome que o precede), como guarda-nocturno, guarda-mor e guarda-florestal, que passam a guardas-nocturnos, guardas-mores e guardas-florestais.

No entanto, estes compostos começados por “guarda” costumam ser invariáveis, porque o mais frequente é a segunda palavra estar já no plural, mesmo quando o nome está no singular, ou seja, quando designa apenas uma pessoa ou coisa. É o caso de guarda-redes, guarda-costas, guarda-jóias, etc.

Repare-se na subtil diferença entre guarda-nocturno e guarda-redes. Em ambos os casos, diríamos, a palavra guarda é nome e não verbo, porque designa uma pessoa (o “guarda”). No entanto, o guarda-nocturno vem seguido do tal adjectivo, que comprova a sua qualidade de nome, e por isso o plural é guardas-nocturnos. O guarda-redes não é, na verdade, um “guarda”, mas antes aquele (jogador) que protege, ou guarda, as redes – está portanto subjacente, na estrutura do composto, a acção de guardar as redes: pelo que temos então o verbo, e não o nome. Assim se explica que o plural não seja "guardas-redes" (porque se trata daqueles que guardam as redes, e não dos "guardas de redes"). Foi por isso que chamei a atenção dos leitores para o facto de estar um adjectivo (e não um nome), a seguir à palavra guarda, quando esta é um nome: é apenas nesses casos que ela pode ir para o plural.


09 setembro 2011

Rular?!!

Decididamente, a língua muda mais depressa do que nós imaginamos. Agora "rular" significa o mesmo que o verbo inglês to rule, na acepção em que é usado em linguagem familiar, ou seja, no sentido em que se aplica a algo popular, que se impõe sobre o resto, que comanda o gosto e a moda.




Assim, na capa da edição portuguesa de Diary of a Wimpy Kid, no lugar de My books rule!, eu, "cota" como sou, preferiria ler algo como "os meus livros são um sucesso" ou "os meus livros são demais!" (fazendo já aqui uma concessão ao "demais" que se tem vulgarizado como adjectivo na linguagem familiar, mas que pelo menos é português).
Para mim, traduzir a frase por "os meus livros rulam!" é tão absurdo como escrever "os meus bucos são demais!" (Sim, os meus "bucos". Se rule é "rular", porque é que books não hão-de ser "bucos"?!). Mas o tradutor está, certamente, atento àquilo que o público-alvo do livro diria, de facto, para exprimir a ideia. E, ao que parece, a expressão "qualquer coisa rula" já se vai vulgarizando...

Custa, claro, a quem tem amor à nossa língua. Mas se pensarmos bem, é o que aconteceu com muitas palavras que hoje consideramos "nossas", como lanche, queque, fiasco, charme e tantas outras. É preciso ver que, em muitos casos deste, o que nos desagrada mais é a novidade estranha, a mudança em si, talvez por receio de não a sabermos acompanhar... Mas a mim irrita-me sobretudo o servilismo tosco do empréstimo desnecessário. Daqui a uns anos ainda caímos no absurdo de ouvir qualquer coisa como "os kides cules é que rulam na secule"...

08 setembro 2011

Isto promete...

A minha filha estava a resolver uma ficha de exercícios de língua portuguesa, do 2.º ano do 1.º ciclo do ensino básico. A certa altura, pedia-se-lhe que conjugasse o verbo comer nos tempos certos:

A cabra amanhã _________ muita erva.

Ela ia transcrever, simplesmente, o verbo comer, tal e qual, no infinitivo. Mas depois percebeu que a frase não faria sentido. Eu chamei a sua atenção para o facto de ter de conjugar o verbo no tempo futuro. E ela, baralhada: «comera? Mas "amanhã a cabra comera" não faz sentido!» Eu corrigi: «comerá. O futuro é comerá
Resposta dela: «Mas eu não falo chinês! Nem como os reis falam...»

06 setembro 2011

Circuncisados ou circuncidados?



Qual das seguintes frases está correcta?




a) Os homens da tribos são, ainda hoje, circuncisados.


b) Os homens da tribo são, ainda hoje, circuncidados.



30 agosto 2011

Sobre o verbo despoletar, ainda e sempre

Afinal, o verbo despoletar é ou não sinónimo de desencadear?

Há duas respostas possíveis a esta pergunta. E contraditórias, por sinal.
A resposta negativa é defendida pela tradição gramatical, que atribui ao verbo despoletar um único significado – o de ação contrária de espoletar: «tirar a espoleta a, travando ou impedindo o disparo de». A partir deste significado literal, o verbo despoletar terá incorporado um sentido figurado: «anular, travar o desencadeamento de alguma coisa».
Mas o verbo contrário ao verbo espoletar não deveria ser desespoletar?
Sim. Terá sido através um processo fonológico, designado síncope, que a forma primitiva desespoletar terá evoluído para despoletar, tendo ocorrido posteriormente a crase dos dois E. O mesmo fenómeno fonético que terá dado origem ao verbo destabilizar, oriundo de desestabilizar.
Por conseguinte, para a tradição normativa, o uso do verbo despoletar como sinónimo de desencadear é uma corruptela, tratando-se de um caso de hipercorreção, tal como aconteceu com o verbo destrocar e tantos outros.

A resposta afirmativa é corroborada por uma corrente linguística contemporânea que considera o prefixo de, não um prefixo com valor de ação contrária, mas, sim, com um valor de reforço, de intensidade, patente em formas como desinquieto, defumar, entre outros. É denominado de prefixo protético.
Assim, atribuindo o valor de reforço ao prefixo de, esta corrente explica o uso generalizado de despoletar como sinónimo de desencadear, deflagrar. E é este uso generalizado o responsável pela inclusão desse significado em alguns dicionários de referência da atualidade.

26 agosto 2011

Desafio linguístico

A frase "Alguns apontam a crise económica como um dos fatores que despoletou os motins", publicada pela agência de notícias LUSA, contém:

(a) zero erros
(b) um erro
(c) dois erros


12 agosto 2011

Nunca houve um fogo neste fogo!

Será a frase do título possível (correcta, do ponto de vista sintáctico-semântico) em português?
Por estranho que pareça, a resposta é sim.

Para quem já se questionou sobre o motivo por que se chamam "fogos" aos apartamentos dos prédios, recomendo  esta explicação do Ciberdúvidas. Afinal, ao que parece, a razão pela qual se dá esse curioso nome às casas não tem nada que ver com apartamentos urbanos, embora seja ainda hoje usado nesse contexto, tal é a força das expressões.

E boas férias de Verão, para quem as tenha!

11 agosto 2011

Acordo Ortográfico

Para quem precise de esclarecimentos neste âmbito, aqui fica a ligação para uma videoconferência sobre o AO.

Acordo Ortográfico

Aproveito para manifestar publicamente a minha indignação perante o uso, em português, por parte da DGIDC e do Ministério da Educação, do termo webinar. Quando muito, e já com algum servilismo ao inglês, deveriam dizer e escrever "webinário" (de web + seminário)...





Ainda o AO

Fernando dos Santos Neves assina um texto intitulado "Onze teses contra os inimigos do Acordo Ortográfico (II)", do qual cito este parágrafo:

«E já agora, e como a subjacente acusação dos antiacordistas é a de que o Acordo Ortográfico constitui um verdadeiro ato de traição a Portugal (o que não deixa de fazer lembrar velhas acusações e despertar velhos fantasmas...), bastaria um mínimo de lucidez para entender que é, precisamente, o Acordo Ortográfico que permitirá a continuação da existência da língua portuguesa no Brasil, etc., a qual, sem ele, inevitavelmente se tornará, a breve trecho, a "língua brasileira”, como de algum modo principiaria a ser o caso. Sem nenhuma tragédia, aliás, para a Humanidade, mas, suponho, com algum legítimo sofrimento para todos os portugueses.


»

Será preciso entender que quem é contra o Acordo (porque não vê nele nem a necessidade nem a capacidade para alcançar o objectivo que se propõe) defende, necessariamente, o "orgulhosamente sós" de eco salazarista?
É que a língua é expressão cultural e, por mais que nos chamemos irmãos, portugueses e brasileiros têm vivências culturais diferentes que se espelham na forma particular de cada povo utilizar a sua versão da língua. E cada versão segue o seu percurso, à medida que a História desenha com maior nitidez as suas idiossincrasias. Não é apenas (mas é também, e não fica resolvida com o AO) uma questão de ortografia! É uma questão de léxico, de sintaxe e afectará também a morfologia.

Não se pode impor politicamente a um povo toda uma forma de falar. E como cada vez mais (infelizmente, acho eu) a fala comanda a escrita, as diferenças aumentarão. Resta saber se nós, ao contrário dos povos que têm o inglês como língua materna, continuaremos a bater com a cabeça na parede pela teimosia de chegar a uma mítica grafia única.




27 julho 2011

Despensa e dispensa

Despensa não despe nem pensa,
é cubículo ou divisão
onde pomos alimentos
para os termos sempre à mão;
dispensa é acto ou efeito
de quem deixa ir, ou não quer:
por exemplo, "se o caldo é fino
ele dispensa a colher."

As coisas complicam-se um pouco
quando pensamos de mais:
pois se a despensa da cozinha
era dispensa em latim
como é que mudou a letrinha
que a torna única assim?
E se a vizinha me dispensa
(porque pode dispensar)
e vai buscar à despensa
um pacote de sal,
porque não hei-de pensar
que é tudo o mesmo afinal?!

Na verdade, os portugueses
com o seu jeito de falar
até podiam escrever "dspensa",
pondo o "simplex" a funcionar...

25 julho 2011

Beneficência ou beneficiência?


É um erro frequente em que caem os mais bem intencionados ;)

A "beneficiência" talvez possa ser a "ciência do benefício", mas a prática da caridade é a BENEFICÊNCIA (sem i antes depois do c), do latim beneficentia. 

 

13 julho 2011

Em que casos o Acordo Ortográfico permite duas grafias?


As chamadas "facultatividades" têm sido dos aspectos mais criticados no Acordo Ortográfico de 1990. Porém, muitos falantes comuns não sabem ao certo o que isto implica. Vejamos alguns exemplos.

Essencialmente, o Acordo permite duas grafias para a mesma palavra nos casos em que há duas possibilidades dentro do que se chama a «pronúncia culta» dos falantes portugueses e brasileiros (v. Base IV do Acordo: «DAS SEQUÊNCIAS CONSONÂNTICAS»): isto acontece com as consoantes b, c, m, e p, que podem ou não ser articuladas. Mas atenção: a facultatividade não se refere só às diferenças entre  o português europeu (PE)  e o português do Brasil (PB), mas também às diferenças na pronúncia dos falantes cultos de um dos países.

Assim, há duas grafias possíveis, por exemplo, entre:

subtil (PE) / sutil (PB)
perspetiva (PE) / perspectiva (PB)
indemnização (PE) / indenização (PB)
receção (PE) / recepção (PB) 

Mas os portugueses também poderão, a partir da entrada em vigor do AO, optar, por exemplo, entre:

espectador / espetador
caracterizar / caraterizar
expectativa / expetativa
dicção / dição
faccioso / facioso
veredicto / veredito

Para além disso, no que respeita à acentuação, há também algumas possibilidades de dupla grafia:

- no caso de dêmos (verbo dar no imperativo ou presente do conjuntivo, 1.ª pessoa do plural) e de fôrma, em que o acento circunflexo é opcional, para se distinguirem estas palavras das respectivas homógrafas demos (verbo dar no pretérito perfeito do indicativo, 1.ª pessoa do plural) e forma (substantivo e 3.ª pessoa do singular do presente do indicativo ou 2.ª pessoa do singular do imperativo) – Base IX «DA ACENTUAÇÃO DAS PALAVRAS PAROXÍTONAS»;

- no caso dos verbos terminados em -ar, quando conjugados na 1.ª pessoa do plural, no pretérito perfeito do indicativo. E cito: «É facultativo assinalar com acento agudo as formas verbais de pretérito perfeito do indicativo, do tipo amámos, louvámos, para as distinguir das correspondentes formas do presente do indicativo (amamos, louvamos), já que o timbre da vogal tónica/tônica é aberto naquele caso em certas variantes do português» (v. a mesma Base);

- nas palavras cuja vogal tónica é representada pelas letras < e > e < o >, quando há uma «oscilação de timbre na pronúncia culta», isto porque o < e >  e o < o > são abertos em Portugal e fechados no Brasil: exemplos: Amazónia/Amazônia, cómodo/cômodo, académico/acadêmico, gémeo/gêmeo, tónico/tônico, bebé/bebê, António/Antônio, ténis/tênis ( segundo o texto do Acordo são «muito poucas»)  – isto nas Bases IX e XI.

Finalmente, este Acordo não elimina os casos que já existiam de dupla grafia, tanto entre PE e PB como dentro de uma das variantes.

Entre PE/PB, em palavras como:
 
quotidiano (PE) / cotidiano (PB)
catorze (PE) / quatorze (PB)
registo (PE) / registro (PB)
planear (PE) / planejar (PB)
húmido (PE) / húmido (PB)
Em PE, por exemplo em:
 
bêbedo / bêbado
cobarde / covarde
febra / fevra
loiça / louça
tulipa / túlipa



04 julho 2011

Dextro ou destro?

Dextru- significa «direito» em latim. Mas... como se escreve afinal esta palavra em português?

Devemos escrever destro, quando o adjectivo significa "que fica do lado direito" e também quando o sentido é "ágil, com boa coordenação motora; hábil".

Quanto a dextro-, é a grafia usada em palavras que contenham este elemento de formação, como por exemplo ambidextro (a pessoa que consegue executar tarefas com ambas as mãos, com a mesma agilidade).


Assim nos explica, por exemplo, uma resposta do Ciberdúvidas, que se baseia no dicionário em linha da Porto Editora.

Porém, e para gerar alguma polémica, o Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea (Academia das Ciências de Lisboa / Verbo), além de apresentar esta mesma informação, também nos diz que dextro é grafia alternativa para destro (na entrada para este adjectivo), apesar de, em dextro, não  indicar que se trata de um adjectivo com o mesmo significado de destro. Por outro lado, consagra ambidestro (com a variante ambidextro).

Conclui-se, então, que ambas as grafias são possíveis nas duas palavras, pelo menos de acordo com esta fonte, embora outras apontem para a diferença que sistematizámos inicialmente. E com estas considerações interrompi a minha leitura de Uma Viagem à Índia de Gonçalo M. Tavares, que aproveito para recomendar!

28 junho 2011

Desafio ortográfico

Qual a forma correcta?

À priori ou a priori?
Aselha ou azelha?
Corropio ou corrupio?
Constróem ou constroem?
Fôr ou  for?
Indeminização ou indemnização?
Paralelepípedo ou paralelipípedo?
Quadruplicar ou quadriplicar?
Pejorativo ou perjorativo?
Reinvindicar ou reivindicar?


(Nota: nada disto tem que ver com o Acordo Ortográfico...)

22 junho 2011

ACORDO ORTOGRÁFICO: contra e a favor

Eis uma síntese dos argumentos contra e a favor do acordo, para reavivar a polémica e ver se aparecem mais comentários neste blogue...

CONTRA O A.O.

1. O Acordo falha redondamente o objectivo de criar uma norma única, porque a ortografia da língua portuguesa continua a ser diferente entre Portugal e o Brasil (vejam-se facto/fato, planejar/planear, registo/registro, perspectiva/perspetiva, recepção/receção, Amazónia/Amazônia, etc...).

2. O A.O. traz custos elevados e desnecessários a inúmeras instituições públicas e privadas, desperdiçando o dinheiro dos contribuintes em tempo de crise.

3. O inglês, o árabe, o francês e o espanhol, que são das línguas mais faladas do mundo, nunca precisaram de acordos ortográficos para garantirem a sua importância mundial e cada uma tem mais de 10 variantes! Então para que precisamos nós dessa falsa e inútil unificação?

4. Portugal é um Estado independente e a língua portuguesa é indissociável da nossa identidade como portugueses. Ceder a vontades estrangeiras é sacrificar a nossa língua aos interesses dos outros.

5. Se continuarmos a seguir o critério fonético, por oposição ao etimológico, iremos descaracterizar por completo a nossa língua. Pouco faltará para escrevermos “oje”, “naxer” e “keres”...

6. Além de desnecessária e antieconómica, a mudança vai gerar insegurança: muitos adultos vão sentir que têm de voltar à escola para aprenderem de novo a escrever...

A FAVOR DO A.O.

1. Não se trata de uma mudança dramática na ortografia, como certos opositores pretendem, mas da alteração gráfica de apenas 1,6% das palavras usadas na variante PE e de 0,5% na variante brasileira.

2. Uma única ortografia facilita a aprendizagem no ensino do português numa perspectiva internacional.

3. O A.O. permite que um único documento, numa grafia única, represente todos os países da CPLP internacionalmente.

4. A criação de uma norma única põe fim à situação (exclusiva do português, entre as línguas europeias) de haver duas normas ortográficas oficiais.

5. O A.O. tem contribuído amplamente para a criação e o aperfeiçoamento de uma série de recursos fundamentais da língua portuguesa que até agora eram inexistentes.

6. Os estudantes portugueses têm hoje, como se sabe, sérias dificuldades na escrita, que comprometem o seu sucesso escolar. A aplicação do A.O. poderá contribuir para reduzir o número de erros ortográficos que cometem.

20 junho 2011

A personagem ou o personagem?

A palavra personagem tem no étimo o mesmo vocábulo latino que a palavra pessoa: persona. Acontece, porém, que ao contrário de pessoa, que é do género feminino e foi herdada do latim, o termo personagem (personne + sufixo -age) terá entrado na língua portuguesa por via do francês. Ora, em francês, ao contrário do que acontece em português, muitos  nomes acabados em -age, como massage, paysage, fromage, voyage, heritage, são masculinos.
Assim se justificará que em português o termo personagem possa, ainda hoje, assumir este género – sobretudo quando designa alguém (real) que se destaca pelas suas qualidades ou pela sua posição social – embora possa também ser do género feminino, à semelhança de pessoa, e tal como outros nomes terminados em -agem, sejam eles provindos do francês (massagem, viagem, passagem, garagem,  “chaufagem* – esta é a brincar!), sejam derivações por sufixação, como contagem, escovagem, plumagem e raspagem. Assim, as personagens das narrativas de ficção podem ser homens ou mulheres, exactamente como as pessoas (pessoa, personagem, criança, vítima, etc. são chamados nomes femininos sobrecomuns), não sendo necessário falar "do personagem" de um romance apenas por ser do sexo masculino.

Deste modo, e ainda que alguns de nós tenham ouvido os professores dizerem que os nomes terminados em -agem são todos femininos em português, pelo menos este (personagem) será um caso excepcional, uma vez que pode assumir os dois géneros.

* Chauffage é palavra francesa que os portugueses adoptaram para designar o aquecimento ou ventilação nos automóveis, mas que no entanto suscita muitas dúvidas na pronúncia e na escrita, variando entre “chofage”, “chofagem”, “sofagem”, “solfagem” e sabe-se lá que mais... nenhuma delas está atestada em português, tanto quanto pude apurar.

16 junho 2011

Ler +


  Sinceramente, não sei pronunciar-me sobre o Programa Ler +. É fácil louvar os objectivos de fundo, mas também é fácil criticar falhas na concepção ou na metodologia da iniciativa.

O que me parece de enfatizar é a necessidade de pais, educadores e professores porem as crianças (e os adolescentes) a ler textos de qualidade (dentro ou fora do programa), para que vejam nos livros lugares únicos de refúgio e lazer, companheiros de viagens enriquecedoras e inesquecíveis, amigos silenciosos insubstituíveis, que os ajudam a encontrar respostas e soluções para os problemas e desafios do quotidiano, mestres brandos mas firmes, que lhes dão as melhores referências para o bom uso da língua.
E aqui faço um sublinhado: numa sociedade tecnológica como é a nossa, em que entre os estímulos essencialmente visuais abundam textos mal escritos, que são precisamente aqueles que mais se "consomem" (pois circulam livremente na net, sem crivos de qualidade, ou são as mensagens escritas pelos nossos amigos e familiares), as referências ortográficas e sintácticas dos jovens são predominantemente as piores. Como resultado, escrevem mal, não por não lerem (acho que nunca se leu tanto como se lê hoje), mas por não lerem textos de boa qualidade linguística. Por isso é tão importante pegar na mão das crianças e conduzi-las para esse mundo surpreendente que está dentro de cada livro, ler para elas de uma forma expressiva e contagiante, ajudá-las a encontrar os livros que mais lhes agradam, os géneros com os quais se identificam, os temas que mais as entusiasmam - sempre sob o lema da diversidade, que é fundamental para se achar o gosto próprio, e depois deixá-las nesse mundo, à sua vontade, sem horas de regresso. Porque, afinal de contas, os livros são um dos poucos lugares aonde as crianças ainda podem ir sozinhas sem perigo de serem maltratadas!

18 maio 2011

Qual o plural de «social-democrata»?

Alguns dicionários de referência admitem ambos os plurais: social-democratas ou sociais-democratas.
Eis os argumentos linguísticos a favor de uma e de outra forma:

1. Social-democratas
A palavra social-democrata é composta pela forma reduzida do adjetivo socialista, pelo que só o segundo elemento, que é autónomo, vai para o plural: social-democratas. À semelhança de «luso-brasileiros», «greco-romanos», «recém-nascidos», entre outros.
Portanto, «social» é abreviatura de «socialista», logo, não vai para o plural.

2. Sociais-democratas
A palavra social-democrata é composta pelo adjetivo pleno social (relativo à sociedade), pelo que deve ser flexionado no plural juntamente com o segundo elemento, também autónomo: sociais-democratas.
Portanto, «social» é palavra autónoma, logo, vai para o plural.

Qual é a vossa opinião?

06 maio 2011

02 maio 2011

Desafio lexical

Evacuam-se edifícios ou evacuam-se pessoas?

22 abril 2011

CEM ou SEM?!

Qual a frase correcta?

a) Sabiam que o papel serve para fazer um cem-número de coisas?

b) Sabiam que o papel serve para fazer um sem-número de coisas?

(Se acharem ridiculamente fácil, desculpem... é que há dias vi esta expressão mal escrita!)

13 abril 2011

O plural dos adjectivos compostos

É uma dor de cabeça. Ou um quebra-cabeças.
Matéria que detesto ensinar, porque invariavelmente acabo a confundir os alunos, em vez de os esclarecer.

E como é que poderia ser de outra maneira, se as gramáticas, os dicionários e as bases de dados morfológicas se contradizem? Por mais que eu tente sistematizar, a pesquisa no sentido de legitimar as minhas explicações leva inevitavelmente à sua questionação.

Com base na minha investigação pessoal, tentei estabelecer regras coerentes deste tipo:

a) O adjectivo é um composto morfossintáctico - ambos os termos se flexionam. Exemplos: alunos trabalhadores-estudantes; crianças surdas-mudas

b) O adjectivo é um composto morfológico - apenas se flexiona o primeiro termo. Exemplos: indivíduos luso-brasileiros, razões histórico-sociais

c) O adjectivo designa uma cor e a segunda palavra é um nome ou adjectivo - nenhum dos termos se flexiona. Exemplos: camisolas verde-garrafa, cartolinas vermelho-vivo

d) O adjectivo designa uma cor e a segunda palavra é claro ou escuro - só se flexiona o segundo termo. Exemplos: calças castanho-claras, vestidos azul-escuros

Esta "arrumação", contudo, tem um problema: apesar de se basear nas recomendações que encontrei em fontes diversas, o consenso entre elas, na globalidade, não existe. Assim, quem tenha tempo e paciência pode sempre dedicar-se a procurar provas de que, na realidade, vale tudo, pelo menos no que respeita às últimas alíneas, c) e d). E aqui fica a irritante prova:


O plural de azul-marinho é azul-marinhos

O plural de azul-marinho é azul-marinho

O plural de azul-marinho é azuis-marinhos

Cada um que decida, portanto, o que prefere usar. Procedimento assaz democrático, sem dúvida, mas muito nefasto, em termos pedagógicos...

05 abril 2011

O falar sentido por um pintor escrevente

Haverá forma mais bonita de sentir a língua portuguesa nas vozes brasileiras?


«O Brasil fez o idioma despir-se, assumir trejeitos de dançarina. Bebo esse sabor como se a palavra nascesse em mim pela primeira vez. Eis a minha língua rematerna.»

Mia Couto, "O Zambeze desaguando na Amazónia" (in Pensageiro Frequente)

31 março 2011

Certo ou errado?


Há dias, na televisão (não interessa o canal), um entrevistado (pouco importa quem) disse uma frase que fixei e que aqui reformulo, com ligeiras alterações, porque me parece boa para um pequeno desafio:

Há uma série de medidas importantes que são precisas tomar o mais depressa possível.

Considerariam certa ou errada esta construção? E porquê?

28 março 2011

A palavra mais comprida do dicionário de língua portuguesa

Alguém sabe qual é? (Não vale dizer arroz, por começar em A e acabar em Z!)

Tem 46 letras e encontra-se atestada no Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa...

24 março 2011

"Há dois anos" = "Dois anos atrás"

Este livro de Mia Couto foi publicado há dois anos atrás.
Certo ou errado, do ponto de vista linguístico?
Errado!

O verbo haver serve, como o verbo fazer, para nos referirmos ao passado. Assim, são sinónimas as frases "Foi há dez anos que lá fomos" e "Faz dez anos que lá fomos". Deste modo, tal como é desnecessário o uso da preposição atrás na segunda frase ("Faz dez anos atrás que lá fomos"), ela também não faz falta na primeira ("Foi há dez anos atrás que lá fomos").
Então, por que motivo se começou a usar essa preposição com o verbo haver, sempre que se fala de tempo? Quanto a mim, há dois motivos principais: por um lado, porque a forma verbal "há" também significa "existe/existem" e, para evitar ambiguidade e mal entendidos, o uso de "atrás" garante que se fala de tempo decorrido. Eis um exemplo: Há dois dias que não contam. Esta frase pode significar "faz dois dias que [eles ou elas, alguém plural de quem se fala] não contam"; ou "existem dois dias [na semana, por hipótese] que não são considerados".
Por isso,  tendemos a dizer "Há duas horas atrás..." para enfatizar o facto de estarmos a referir-nos a qualquer coisa que aconteceu duas horas antes ou atrás (e não a "duas horas que existem").
E isto leva-nos ao segundo motivo: é que a preposição atrás serve, realmente, para indicar a anterioridade no tempo. Por isso ela pode ser usada em vez (como equivalente) do verbo haver (Daí a tendência para misturar tudo, que é uma espécie de tautologia, como dizer "elo de ligação" ou "outra alternativa").
Aliás, atrás é mesmo aconselhável quando usamos o discurso indirecto, para substituir o verbo haver, se não o quisermos conjugar noutro tempo, que não o presente. Repare-se na transição do discurso directo para o indirecto neste exemplo:

DISCURSO DIRECTO: "- O que fizeram três meses? - Perguntou."
DISCURSO INDIRECTO: Ele perguntou o que tinham feito três meses atrás.

Em alternativa, poder-se-ia manter o uso do verbo haver, mas conjugado no pretérito imperfeito (coisa que muita gente não se lembra de fazer, mantendo haver no presente):

DISCURSO DIRECTO: "- O que fizeram três meses? - Perguntou."
DISCURSO INDIRECTO 1 : Ele perguntou o que tinham feito havia três meses.
DISCURSO INDIRECTO 2: Ele perguntou o que tinham feito três meses.

Ora, esta última frase (2), com o verbo haver no presente, só se justifica quando o momento em que se concretiza o discurso indirecto é próximo, no tempo, do momento de enunciação do discurso directo (se os "três meses atrás" forem os mesmos para quem falou primeiro e para quem ouve o discurso indirecto).

Concluindo: "há" não precisa de "atrás" para nada, quando falamos do passado. Mas "atrás" serve para substituir "há", quando "há" deveria ser "havia". A explicação que ficou para trás é confusa e provavelmente desnecessária... perdoem-me. A intenção era boa!




23 março 2011

"Há dois anos atrás"?

Será aconselhável ou desaconselhável esta construção ("há... atrás")?

18 fevereiro 2011

A propósito do Acordo Ortográfico e das "facultatividades"...



Apresento-vos este pequeno desafio (não vale ir ver as respostas antes de escrever um comentário!).
Das seguintes palavras, quais as que, com o Acordo Ortográfico de 1990, admitem duas grafias em Portugal (com e sem a consoante c)?

acupunctura
afectuoso
característica
caracterizar
colectividade
dicção
expectativa
expectoração
facto
faccioso
objectar
optimizar
predilecção
transacto
veredicto