28 setembro 2010

Oralidade e correcção linguística


Sabemos, é claro, que o registo oral, sobretudo o informal, permite certos desvios à norma e algumas construções que na escrita seriam consideradas incorrectas. Ainda assim, há limites para aquilo que se pode considerar aceitável.
Imaginem, então, que alguém enuncia esta frase, a propósito do que outra pessoa acaba de dizer:

«Há dois anos atrás, eu subscrevia por baixo do que você está a dizer.»

A minha pergunta é: esta frase é aceitável, do ponto de vista da correcção linguística? Se não, porquê?

23 setembro 2010

Atentamente e Atenciosamente

A fórmula de despedida de ofícios e cartas formais inclui, com frequência, um destes dois advérbios. Porém, há quem condene atenciosamente, alegando que é uma espécie de "deturpação" de atentamente, há quem diga que é atentamente que se deve utilizar em Portugal, ao passo que atenciosamente se usa no Brasil, há quem defenda que atenciosamente é para empregar quando conhecemos o destinatário e atentamente quando o destinatário da carta é alguém desconhecido, e finalmente há quem fique na dúvida e não saiba por qual dos dois deve optar.
O Ciberdúvidas esclarece que ambos se podem usar em Portugal, pois os seus significados são bastante próximos. O Curso de Redacção de J. Esteves Rei (2.º volume, edição de 2000, da Porto Editora, página 160) indica que as fórmulas de cartas comerciais tanto podem incluir atenciosamente, como, «para mais delicadeza», atentamente.
A nossa opinião é a de que, se o falante está consciente do significado destas palavras (atenciosamente: "com cortesia, com deferência"; atentamente: "de forma atenta", "com atenção"), deve fazer uso de alguma liberdade para poder escrever de forma minimamente pessoal, dentro do espartilho que são as regras para a redacção de cartas formais. A reacção do destinatário será sempre, em certa medida, imprevisível: a menos que lhe perguntemos antes, não temos maneira de saber se será uma das pessoas que acreditam apenas em atentamente, ou uma das que preferem atenciosamente...

16 setembro 2010

Coisa, coiso e coisar


O verbo coisar, pelo menos em Portugal, é dos mais úteis que há. E a sua utilidade prende-se, obviamente, com a fantástica versatilidade do substantivo coisa, que por ser tão versátil se usa também no masculino, pois há coisas e coisos, dependendo, claro, do que se pretende designar, em cada caso. Quando no discurso (convém que seja oral) optamos por fazer uso da coisa, a indeterminação daquilo que se pretende designar pode estar relacionada com a intenção de não explicitar o que é, ou quem é («tenho uma coisa para ti»), mas sente-se sempre a enorme vantagem que essa mesma indeterminação representa, dado que as coisas nem sempre são fáceis de definir, sobretudo quando temos de nos exprimir depressa.

No nosso quotidiano linguístico, uma coisa pode ser um objecto, uma ideia, um sentimento, uma criatura animal, vegetal ou mineral. Pode designar tanto uma ferramenta («onde é que está aquela coisa para abrir tampas de frascos?») como uma pessoa de cujo nome não nos lembramos («Hoje vi a coisa... a...a Simone!»), uma dor («sinto uma coisa esquisita aqui»), uma atitude («foi uma coisa parva o que fizeste»), um assunto («falemos de coisas sérias»), ou mesmo uma acção que cabe ao ouvinte decifrar, de acordo com o contexto, a expressão facial de quem utiliza a expressão, o seu tom de voz e sabe-se lá que outros sinais («e depois eles... coiso!»).

Ora, era de prever que, com tanta coisa que a coisa pode significar, o verbo coisar havia de revelar-se útil em muitas situações. E eis que surgiu na nossa língua!
Se vem ou não no dicionário que consultamos, pouco importa. No da Academia das Ciências de Lisboa, como é de esperar, está contemplado. É para usar em registo popular e significa, antes de mais, «fazer reflexões», o mesmo que matutar, pensar. Segundo a mesma fonte, é no Brasil que coisar tem o sentido de «preparar ou fazer alguma coisa». E há coisas surpreendentes, como não aparecer em determinado dicionário de língua portuguesa, mas constar do dicionário de português-inglês da mesma editora, para que os estrangeiros saibam o que de facto significa esse verbo tão expressivo  que não é exclusivo do nosso idioma (coisar = to do em inglês; tun em alemão; cosare em italiano), e cujo significado também pode ser «ter relações sexuais», voltando ao Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea.
E agora, se não se importam, vou coisar esta coisa, porque tenho de coisar um coiso antes que fique coisado!




10 grandes mitos da Língua Portuguesa

Mito 1 – Um dia de sol é um dia “solarengo”.
Verdade – Um dia de sol é um dia soalheiro.

Mito 2 – Cada um dos caracteres tipográficos designa-se “caracter”.
Verdade – Cada um dos caracteres tipográficos designa-se carácter.

Mito 3 – A palavra “açoreano” escreve-se com E, porque deriva de Açores.
Verdade – A palavra açoriano escreve-se com I, porque à base açor se associou o sufixo -iano.

Mito 4 – A presença de álcool no sangue designa-se “alcoolémia”.
Verdade – A presença de álcool no sangue designa-se alcoolemia.

Mito 5 – Uma assinatura abreviada designa-se “rúbrica”.
Verdade – Uma assinatura abreviada designa-se rubrica.

Mito 6 – Uma grande confusão é “uma grande salganhada!”
Verdade – Uma grande confusão é “uma grande salgalhada!”

Mito 7 – O plural de DVD é “DVD’s”.
Verdade – O plural de DVD é DVD. As siglas não têm plural.

Mito 8 – Os meios de comunicação social designam-se os “m[i]dia”.
Verdade – Os meios de comunicação social designam-se os m[é]dia. Trata-se de uma palavra latina.

Mito 9 – A palavra cessão designa o acto de cessar, acabar.
Verdade – A palavra cessão designa o acto de ceder. O acto de cessar designa-se cessação.

Mito 10 – A uma pessoa indesejável (numa família, por exemplo) designamos “ovelha ranhosa”.
Verdade – A uma pessoa indesejável (numa família, por exemplo) designamos ovelha ronhosa. O nome ronha, que designa uma doença, deu origem ao adjectivo ronhoso, cujo sentido literal é: «que tem ronha». Este sentido literal, por sua vez, deu origem ao sentido figurado «pessoa indesejável».