29 junho 2007

"Omenagem à Hortografia"

Um texto que não escrevemos, mas que, pela sua relevância e contundência, achámos pertinente publicar aqui:


Por: Francisco José Viegas, Escritor


A senhora menistra da Educação açegurou ao presidente da República que, em futuras provas de aferissão do 4.º e do 6.º anos de iscolaridade, os critérios vão ser difrentes dos que estão em vigor atualmente. Ou seja os erros hortográficos já vão contar para a avaliassão que esses testes pretendem efetuar. Vale a pena eisplicar o suçedido, depois de o responçável pelo gabinete de avaliassões do Menistério da Educação ter cido tão mal comprendido e, em alguns cazos, injustissado. Quando se trata de dar opiniões sobre educassão, todos estamos com vontade de meter o bedelho. Pelo menos.

Como se sabe, as chamadas provas de aferissão não são izames propriamente ditos limitão-se a aferir, a avaliar - sem o rigôr de uma prova onde a nota conta para paçar ou para xumbar ao final desses ciclos de aprendizagem. Servem para que o menistério da Educação recolha dados sobre a qualidade do encino e das iscólas, sobre o trabalho dos profeçores e sobre as competênssias e deficiênçias dos alunos.

Quando se soube que, na primeira parte da prova de Português, não eram levados em conta os erros hortográficos dados pelos alunos, logo houve algumas vozes excandalisadas que julgaram estar em curso mais uma das expriências de mudernização do encino, em que o Menistério tem cido tão prodigo. Não era o caso porque tudo isto vem desde 2001. Como foi eisplicado, havia patamares no primeiro deles, intereçava ver se os alunos comprendiam e interpetavam corretamente um teisto que lhes era fornessido.
Portantos, na correção dessa parte da prova, não eram tidos em conta os erros hortográficos, os sinais gráficos e quaisqueres outros erros de português excrito. Valorisando a competenssia interpetativa na primeira parte, entendiasse que uma ipotetica competenssia hortográfica seria depois avaliada, quando fosse pedido ao aluno que escrevê-se uma compozição. Aí sim, os erros hortográficos seriam, digamos, contabilisados - embora, como se sabe, os alunos não sejam penalisados: á horas pra tudo, quer o Menistério dizer; nos primeiros cinco minutos, trata-se de interpetar; nos quinze minutos finais, trata-se da hortografia.

Á, naturalmente, um prublema, que é o de comprender um teisto através de uma leitura com erros hortográficos. Nós julgáva-mos, na nossa inoçência, que escrever mal era pensar mal, interpetar mal, eisplicar mal. Abreviando e simplificando, a avaliassão entende que um aluno pode dar erros hortográficos desde que tenha perssebido o essencial do teisto que comenta (mesmo que o teisto fornessido não com tenha erros hortográficos). Numa fase posterior, pedesse-lhe "Então, criançinha, agora escreve aí um teisto sem erros hortográficos." E, emendando a mão, como já pedesse-lhe para não dar erros, a criancinha não dá erros.

A questão é saber se as pessoas (os cidadões, os eleitores, os profeçores, "a comonidade educativa") querem que os alunos saião da iscóla a produzir
abundãnssia de erros hortográficos, ou seja, se os erros hortográficos não téêm importânssia nenhuma - ou se tem. Não entendo como os alunos podem amostrar "que comprenderam" um teisto, eisplicando-o sem interesar a cantidade de erros hortográficos. Em primeiro lugar porque um erro hortográfico é um erro hortográfico, e não deve de haver desculpas. Em segundo lugar, porque obrigar um profeçor a deixar passar em branco os erros hortográficos é uma injustiça e um pressedente grave, além de uma desautorizassão do trabalho que fizeram nas aulas. Depois, porque se o gabinete de avaliassão do Menistério quer saber como vão os alunos em matéria de competenssias, que trate de as avaliar com os instromentos que tem há mão sem desautorisar ou humilhar os profeçores.

Peçoalmente, comprendo a intensão. Sei que as provas de aferissão não contam para nota e hádem, mais tarde, ser modificadas. Paço a paço, a hortografia háde melhorar.

25 junho 2007

"Mais bem" existe e é correcto!


No último número da revista Volta ao Mundo, deparei-me com este anúncio: "Melhor equipado só com mordomo incluído."

Certamente já estão à espera do que eu vou escrever a seguir: há ali um erro de português. Mas onde?

O erro está em escrever (ou dizer) "melhor equipado" - porque, quando estamos a modificar um adjectivo participial (ou seja, um adjectivo que provém do Particípio Passado de um verbo, como equipado, preparado, classificado, vendido, escrito...), não devemos flexionar em grau os advérbios bem e mal.

Talvez vos custe aceitar mais essa regra, que aparentemente ninguém cumpre, pois, ao que parece, ninguém sabe que ela existe. Mas isso não é verdade! Porque, como facilmente constatarão, raríssimas são as pessoas que ignoram essa regra quando se seguem Particípios (irregulares, mas ainda assim Particípios) como feito, dito, escrito. Por acaso costumam dizer que uma coisa está "melhor" ou "pior" feita do que outra?!

21 junho 2007

Roubo e furto

Uma das muitas (e boas!) sugestões do Jaime foi esta: elucidar os leitores sobre a diferença entre roubo e furto.

Embora em ambos os conceitos esteja subjacente a ideia de tirar a alguém, indevidamente, os seus haveres, no caso do furto essa acção não implica violência (ou ameaça), enquanto o roubo já pressupõe a ideia de que a vítima é forçada, sob ameaça ou mesmo violência, a entregar os seus bens.

Em rigor, portanto, quando descrevemos uma situação de qualquer um dos dois tipos, apenas uma das palavras se aplica, e não ambas: se um estranho entra em casa de alguém e leva os objectos de valor enquanto o dono dorme, há furto. Se alguém na rua é forçado a entregar o dinheiro que tem na carteira, sob a ameaça de uma arma ou de uma seringa contaminada, trata-se de roubo.

Todavia, o que acontece é que – sobretudo quando se usa o verbo correspondente – existe uma marcada tendência para escolher roubar, haja ou não violência inerente ao acto. Talvez porque o verbo furtar tenha vindo a ser preterido, na linguagem corrente, e cada vez mais associado a um registo formal e antiquado. E é preciso admitir que os dicionários actuais apresentam os termos roubar e furtar como sinónimos, portanto, dando razão a quem os usa indiferenciadamente. Na linguagem jurídica, porém, não há confusões. Roubo não é furto e furto não é roubo!

20 junho 2007

“Do” ou “de o”?

Será mais um preciosismo, mais uma batalha garantidamente perdida?

A verdade é que há uma diferença entre contrair ou não contrair preposições como a, de, por e determinantes ou pronomes como o, a, ele, ela, este, isto, etc.

A diferença reside no facto (e aqui já temos uma frase exemplificativa) de o referido determinante ou pronome ser ou não o sujeito de uma oração infinitiva. No caso da frase anterior, por exemplo, temos um verbo no Infinitivo (“ser”) cujo sujeito é “o referido determinante”. É por isso que seria incorrecto escrever: *“a diferença reside no facto do determinante ser ou não sujeito”. É como se a separação entre de e o servisse precisamente para evidenciar, a priori, a importância do determinante o enquanto sujeito da oração seguinte, para avisar os leitores de que a frase não acaba ali.

Se após o determinante ou pronome não houver nenhum verbo no Infinitivo, então já é recomendável contraí-lo com a preposição anterior. Por exemplo aqui: “Achei óptima a ideia dele.” (Em vez de: *“Achei óptima a ideia de ele.”). E até poderia haver uma oração a seguir, desde que ele não fosse o respectivo sujeito. Por hipótese: “Achei óptima a ideia dele, embora me parecesse um pouco ousada.”

Admito que esta regra cada vez é mais ignorada, até por pessoas que escrevem bem. Mas isso, como sabem, não é argumento que nos detenha. Se fosse, nem valeria a pena continuar este blogue!

15 junho 2007

A virtualidade da virtude de complicar

Muita gente complica.

Dizem que a língua portuguesa é traiçoeira, que engana, que é difícil, e por aí fora. Mas a verdade é que não são raras as vezes em que somos nós, os falantes, que atraiçoamos a própria língua.

Hoje o Jaime alertou-me para o facto de haver quem diga virtualidade em vez de virtude. Não me surpreendeu, uma vez que é frequente as pessoas optarem – sobretudo em contextos formais – por palavras mais compridas, mais “bem sonantes”, mas que afinal não significam aquilo que elas pensam e por isso tornam o discurso incorrecto ou até incoerente.

Virtualidade é a qualidade daquilo que é virtual, ou seja, potencial, possível, ou ainda simulado (por oposição a real); a virtude é uma qualidade moral positiva, por oposição a um defeito. Assim, será muito pouco provável haver um contexto em que ambas as palavras possam ser usadas como sinónimas. Vejam, por exemplo, o resultado de trocar uma pela outra nestas frases: “estamos a entrar numa era em que a virtualidade assume a mesma importância que o real” e “a honestidade continua a ser considerada uma virtude”.

Uma confusão semelhante ocorre com os termos referir / referenciar e notar / denotar, que também não têm o mesmo significado, mas que muitos falantes usam alternadamente, como se tivessem, consoante a formalidade da situação.

11 junho 2007

Há Portugueses e portugueses?


Sem dúvida :)

Portugueses, com maiúscula, e apenas enquanto substantivo, deve ser usado sempre que queiramos referir-nos a todos os indivíduos que o gentílico designa – seja no singular ou no plural –, ainda que estejamos a fazer uma daquelas generalizações pouco rigorosas, que dependem mais da experiência limitada ou da opinião subjectiva de cada um do que de uma análise rigorosa da realidade. Por exemplo, nas frases “os Portugueses são um povo pessimista” ou “o Português tem jeito para falar línguas”.
Enquanto substantivo, é preferível usar portugueses, com minúscula, nos contextos em que designa apenas algum ou alguns indivíduos, mas não todos, na generalidade. Por exemplo, se alguém escrever que “encontrou muitos portugueses quando esteve de férias em Espanha”, ou uma anedota sobre um português, um francês e um inglês que vão num avião (lembram-se dessa?!). Enquanto adjectivo, portugueses deve ser sempre escrito com minúscula, mesmo quando designa a generalidade dos indivíduos. Por exemplo em “as mulheres portuguesas são bonitas”, ou em “o homem português é corajoso”.
Enfim, são pormenores insignificantes, para quem nem se preocupa em pôr acentos gráficos nas palavras, mas que têm importância para os que fazem questão de escrever bem.

08 junho 2007

Os pombos-correio fizeram horas extras, ao contrário dos peixes-espada e dos porcos-espinhos!

Quem não teve já dúvidas aos formar os plurais de certas locuções nominais e de nomes compostos? É que algumas das regras que determinam a sua flexão em número nem sempre são fáceis de interpretar...

Vejamos estas duas: a) se o composto for formado por dois nomes ou nome e adjectivo, flexionam-se ambos os termos no plural; b) se o segundo termo, sendo um nome, funcionar como determinante do primeiro, só o primeiro se flexiona no plural.

Exemplifiquemos com hora extra e pombo-correio.

No primeiro caso, extra é um adjectivo (formado por truncamento a partir da palavra extraordinário). Logo, concorda em número com o nome que qualifica. Assim como diríamos “horas extraordinárias”, também devemos dizer “horas extras” – porque as palavras truncadas também têm plural (como fãs, motos, metros, pneus, etc.)

No segundo caso, o substantivo correio também, de certo modo, qualifica o nome pombo, mas não se flexiona no plural porque está a condicionar o significado do primeiro termo: podemos dizer que se trata de pombo(s) com função de “correio”. Não faria sentido dizer que, quando os pombos são vários, também passa a haver diversos “correios”. Há, nesse caso, vários pombos com a mesma função (de correio).

É a mesma lógica do peixe-espada: podemos referir-nos a vários peixes, mas nunca serão várias “espadas”, porque o termo espada apenas indica que os peixes têm essa forma.

Já a flexão de porco-espinho em número deve formar-se com ambos os termos no plural: porque, afinal, não se trata de um porco com forma de espinho, mas de um nome composto por dois substantivos em que nem um nem outro designa directamente a realidade representada. Por isso, ambos se flexionam: porcos-espinhos.

Conclusão: formar um plural de um nome composto dá muito que pensar!

(08.06.07)

05 junho 2007

E se recusasse fazer o teste da “alcoolémia”?

Se for a conduzir e um agente da polícia o interceptar e lhe pedir que faça o teste da “alcoolémia”, pode negar-se a fazer esse teste, explicando, delicadamente, o motivo da sua recusa: esse teste simplesmente não existe! Passo a explicar:
Está a generalizar-se a pronúncia e grafia -émia de algumas palavras formadas pelo sufixo grego -emia, que significa “sangue”: *glicémia e *alcoolémia, por exemplo.
Esta grafia está incorrecta, uma vez que esse sufixo não contém qualquer acento gráfico desde a sua origem.
Não deixa de ser estranha esta tendência, visto haver várias palavras terminadas em -emia que são pronunciadas e escritas correctamente, tais como anemia (e não *anémia) e leucemia (e não *leucémia).

Por conseguinte, se não hesita em dizer e escrever anemia e leucemia, então seja coerente e diga que apenas se submete ao teste da alcoolemia!

04 junho 2007

Dispêndio, dispendioso e... despender?!

Estas palavras da mesma família geram confusão na cabeça de muita gente... e por uma boa razão. Pois se dispêndio e dispendioso se escrevem com i, por que razão havemos de escrever o verbo despender com e?

Na verdade, se consultarmos o Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa de José Pedro Machado, concluiremos que estes dois termos têm uma origem muito próxima. E, em latim, o verbo dispendere escrevia-se com i. Mas, segundo o mesmo dicionário, pelo menos desde o século XIII que despender, em português, se grafa com e. O motivo será este: enquanto dispendiu entrou na língua portuguesa por via culta, dispendere terá entrado por via popular, pelo que se deu a transformação da primeira vogal, de acordo, aliás, com a forma como pronunciamos a palavra ainda hoje.

Não há nada a fazer, por enquanto é mesmo assim: o verbo com e, o adjectivo e o substantivo com i. Quem sabe não acham útil esta espécie de mnemónica de última hora: despender escreve-se com e de vErbo; dispêndio e dispendioso escrevem-se com i de adjectIvo e de substantIvo!