20 abril 2009

Esclarecimento

Naturalmente, este esclarecimento teria surgido mais cedo, se eu me tivesse apercebido da publicação desta notícia no dia 6 de Março. Só ontem soube que fui apelidada de "linguista", o que, como todos poderão constatar ao verificar o meu perfil, não corresponde à realidade.
É preciso dizer que o jornalista teve o cuidado de me telefonar, após a nossa breve conversa no fim da apresentação que fizemos na Expolíngua, para me perguntar precisamente se eu poderia ser considerada uma linguista. Expliquei-lhe que não seria rigoroso, embora pudesse ser um termo útil para se referir às duas - a mim e à minha colega S. Duarte. No entanto, sou referida na notícia, isoladamente, como linguista, coisa que eu não esperava e penso que não faz sentido. Sou apenas uma professora de Língua Portuguesa, mais nada.

Por outro lado, o artigo centra-se numa posição radical contra o Acordo Ortográfico que terei assumido durante a apresentação na Expolíngua. Quando o li, fiquei um tanto chocada, porque ainda que eu tenha realmente proferido aquelas palavras, lê-las assim descontextualizadas não permite supor que eu também poderia falar a favor do Acordo. Porque considero que, como tudo, o Acordo tem vantagens e desvantagens.

Finalmente, a minha afirmação "politicamente incorrecta" de que no Brasil se fala outra língua pode ofender muita gente, inclusivamente aqueles que lêem este blogue. Quanto a isso, só posso explicar que, para mim, se trata de um fenómeno muito natural e comparável ao que sucedeu na Península Ibérica com o Latim: se nesta região os diferentes povos, com as suas culturas distintas, deram origem a línguas diversas, todas elas derivadas da mesma, como não aceitar que entre o português do Brasil e o que se fala em Portugal as divergências crescentes não dêem, também, origem a falares distintos, com prosódia, léxico e gramáticas próprias?

E, nesse sentido, preciso ainda de acrescentar o seguinte: este blogue é sobre a língua portuguesa que se fala em Portugal. Não por qualquer espécie de "embirração", longe de nós, mas simplesmente devido à nossa quase total ignorância sobre a(s) variante(s) que se falam e escrevem no Brasil. Seria tão absurdo pretender que os nossos esclarecimentos fossem válidos para os Brasileiros como para os Galegos. Daqui os saudamos, a uns e a outros, com respeito e com pena de não lhes podermos ser úteis.

8 comentários :

Allan Melo disse...

Meu nome é Allan, sou estudante de jornalismo no Rio de Janeiro. Sou o "anônimo" que tem feito as perguntas nos últimos posts.

Bem, sobre o seu ponto de vista contra o acordo ortográfico, espero que entenda que o principal motivo desta reforma é justamente a difusão das variantes culturais nos diversos países que falam português.

Como "linguista", deves saber que os países que falam português são a "Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Macau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste, sendo também falada nos antigos territórios da Índia Portuguesa (Goa, Damão, Diu e Dadrá e Nagar-Aveli), além de ter também estatuto oficial na União Europeia, no Mercosul e na União Africana." (Wikipédia)

O mesmo site ainda refere um ponto de vista interessante: "Deve-se considerar, porém, que o português de hoje compreende vários dialetos e subdialetos, falares e subfalares, muitas vezes bastante distintos, além de dois padrões reconhecidos internacionalmente (português brasileiro e português europeu). No momento actual, o português é a única língua do mundo ocidental falada por mais de cem milhões de pessoas com duas ortografias oficiais (note-se que línguas como o inglês têm diferenças de ortografia pontuais mas não ortografias oficiais divergentes)"

Sendo assim, para uma maior difusão da nossa cultura, tão AMPLA e RICA em detalhes, por que também não facilitamos a vida dos estrangeiros que buscam conhecer a nossa lingua unificando-a em uma só? As diferenças não são muitas e parecem apenas "dialétos". Se vocês acham que há diferenças grandes entre nossas línguas, experimente conversar, oralmente, com um morador do interior do Ceará ou da Paraíba, aqui no Brasil...

Acho que essa resistência sem fundamento sobre a unificação de nossa lingua só é feita pelos Portugueses, que reclamam da quantidade de palavras que serão modificadas em relação com a dos Brasileiros...

Pn2L8 disse...

Está feito o esclarecimento. Os jornalistas (nem todos claro) gostam sempre de descontextualizar e através dos outros expressar a sua própria opinião ou aquilo que mais lhes convém. Concordo com a sua "separação" entre o brasileiro e o português. Se não fossem as telenovelas, que nos habituaram a entender os brasileiros, acho que teríamos um maior desentendimento. Palavras como "camisola" e "rapariga", por exemplo, ainda causam alguma confusão.

S. Leite disse...

Olá, Allan. Compreendo o seu ponto de vista, mas, como certamente saberá, apenas no Brasil e em Portugal a língua materna é realmente o português (admitamos que ainda é a mesma língua!). Porque nos países de África e Ásia, as línguas maternas das populações são outras e o português, ainda que seja língua oficial, é a língua segunda da maior parte das pessoas. Por isso é muito mais parecido com o de Portugal do que o português do Brasil, que serve de facto a comunicação de todos, dia a dia. Ora, o uso, marcado pela cultura, modifica as línguas realmente vivas, nacionais (e não apenas oficiais). Daí que as diferenças cresçam a olhos vistos.
Esse argumento de que é para dar a conhecer ao mundo a beleza do nosso idioma que a suposta unificação trazida pelo Acordo se legitima, para mim, é falacioso. Não apenas por causa de todas as "facultatividades" que permanecerão (se a prosódia é diferente, como é que a acentuação gráfica, por exemplo, poderia ser igual?!), mas também por tantas divergências lexicais e sintácticas, que, por mais convenções ortográficas que se criem para aproximar as duas versões do português, sempre "confundirão" os estrangeiros...
Os portugueses que reclamam apenas por causa da quantidade de palavras que vão sofrer alterações não estão devidamente informados. E já li textos de brasileiros que são contra o Acordo, por exemplo na revista Veja de 12/09/2007. Esses não me pareceram mal informados!

Allan Melo disse...

Bem... entendo quando você fala que viu na Veja em 2007 a opinião dos profissionais de comunicação sobre a Reforma. Mas bastou dar a virada do ano que mais da metade das redações já aderiram à ela. Dentre eles, o IG, o Globo.com, UOL, Terra...

...as que ainda não aderiram, começam a treinar os jornalistas e vão implando aos poucos. Se aqui no Brasil, que havia uma certa repulsa, há adesão, porque não poderia haver por parte de vocês, também ?

Pode não ter ligação, mas desde o início dessa reforma, nunca achei tantas referências de conteúdo português (de Portugal) quanto antes... sobre o meu lado, aqui do Rio, vejo que existe sim uma aproximação...

Pn2L8 disse...

anônimo ou anónimo?
dialéto ou dialecto?
à ela ou a ela?
há adesão ou à adesão?

Já agora, S. Leite, tenho uma questão: parece-me que como lingua o português de Portugal evoluiu mais que o do Brasil, isto é, por vezes quando oiço ou leio o português do Brasil tenho a impressão de estar a ouvir ou ler o português dos meus avós. Será assim? Se sim, ao acertarmos algumas palavras com o Brasil não estaremos nós a retroceder?

S. Leite disse...

Não vejo retrocesso nesse "acerto" com o português do Brasil (vejo, sobretudo, uma imposição desnecessária e artificial), embora por vezes também chegue à conclusão de que os brasileiros mantiveram muitas expressões do falar dos portugueses "antigos", o que é natural, mas não implica que o seu uso do português seja mais antiquado, apenas serve para comprovar que a origem da "língua deles" é a mesma ;)
Ambas as variantes evoluíram e sofreram influências, mas cada uma seguiu o seu caminho. O que se manteve aqui em Portugal não é necessariamente o mesmo que se manteve lá. Da mesma forma, as mudanças que ocorreram não são as mesmas, porque as culturas e os contactos com outras línguas foram diferentes. A influência do inglês, por exemplo, no caso do Brasil é muito mais norte-americana do que a nossa, que é mais britânica.
Isto é o que eu ACHO, não sendo, de todo, uma entendida na matéria...

Filipe disse...

Antes de mais, saúdo as duas autoras do blogue, assim como os seus leitores.
Sou um aluno a finalizar este ano o ensino secundário, pelo que ainda tenho pela frente um árduo caminho que passa, não só, pela descoberta da Língua Portuguesa, como também pela construção e organização dos meus conhecimentos.
Deparei com este blogue recentemente, numa das minhas divagações pelos meandros da bela Língua Portuguesa - pela qual muito me interesso - e fiquei positivamente impressionado, até porque penso que o desejo de informar acerca de inúmeros aspectos de uma língua tão complexa e vasta que, amiúde, nos deixa perdidos, é um acto nobre e louvável.
Deste modo, gostaria de deixar aqui um breve comentário acerca da temática deste post, avisando no entanto que não possuo largos conhecimentos sobre o assunto. O que eu gostaria de dizer será mais uma opinião pessoal e não fundamentada acerca do Acordo Ortográfico, pelo que, se dizer algo que não corresponde à realidade, peço desculpa.

Relativamente às duas variantes da Língua Portuguesa que, indiscutivelmente, possuem inúmeras diferenças, concordo que resultaram de uma evolução cultural divergente que, na minha opinião, não deve ser desprezada.
Penso que, acima de tudo, são estas diferenças que tornam a nossa língua tão bela, e que fazem dela um expoente máximo da cultura de uma nação e da sua evolução.
Além disso, apesar de tantas diferenças e de algumas dúvidas, é perfeitamente possível encetar uma conversa com uma pessoa que fale o Português do Brasil e entendê-lo.
É por essa razão que concluo que esta convergência, em vez de facilitar o que quer que seja (até porque, convenhamos, há tantos livros cuja linguagem se tornaria desactualizada, o que originaria mais um problema), vem distorcer o resultado de uma evolução com história, antecedentes e consequências, sendo, afinal, o legado dos nossos antepassados.
Penso, acima de tudo, que a "resistência dos portugueses" será válida, não numa perspectiva de "embirração", mas numa tentativa de evitar a perda de um dos melhores denunciantes da singularidade de cada cultura.
Em suma, acho que este acordo ortográfico será mais prejudicial do que benéfico para os dois lados.

No entanto, esta é apenas a minha opinião e visão das coisas, e agradeço alguma correcção ou reparo, em caso de necessidade.

Cumprimentos e parabéns às autoras por manterem um blogue tão interessante!

Filipe Cachide.

Leonardo Brayner disse...

Não sei esse é o blogue mais indicado, mas aí vai a minha opinião sobre a real razão do implemento do acordo ortográfico: direitos autorais dos estatutos e códigos. Não sou de maneira nenhuma entendido do assunto, mas alguma integração política está por vir com essa onda da Nova Ordem Mundial, em que a constituição européia (ou mundial, conferindo autoridade à ONU em detrimento das nações soberanas) valeria para o Brasil e os demais países lusófonos, sendo essa traduzida para um único português.