12 janeiro 2012

A.O. e outros problemas

Ainda na ordem do dia, o "novo" Acordo Ortográfico atrapalha a vida a muita gente, embora se possa pensar que deixarmos de escrever algumas consoantes que não se pronunciam pode simplificar a tarefa de escrever em português.
Atrapalha, porque as dúvidas surgem a todo o momento, sobretudo quando é necessário escrever palavras compostas ou formadas por prefixação (cocolaborador ou co-colaborador?), ou quando nos preparamos para usar maiúsculas (norte ou Norte?) mas também quando não temos a certeza de se pronunciar, na "norma culta", determinada consoante (Egipto ou Egito?). E atrapalha muitas vezes os professores e os pais que lidam com crianças no ensino básico e cujos manuais e textos de apoio estão escritos de acordo com as duas grafias: a de 1945 e a de 1990. Com efeito, não é fácil para eles, nem para as crianças, gerir com os melhores resultados, ao nível da produção, as leituras "mistas" que se vão fazendo e que vão baralhando as referências ortográficas de cada um.
A fase de transição é realmente muito ingrata. Pela minha parte, por mais que deteste as novas regras que me obrigam a "descaracterizar" as palavras (ação, ator, redação e ótimo parecem-me tão feias...), sei que me vou habituar e que daqui a uns tempos já nem vou pensar mais nisso. Por outro lado, ao lidar quase diariamente com alunos recém-chegados ao ensino superior, estou consciente de que as dificuldades que muitos adultos revelam na escrita são bem mais abrangentes e graves do que as hesitações provocadas pela novas regras ortográficas. Custa-lhes tanto expor ideias (quando as têm) por escrito, é-lhes tão difícil distinguir passa-se de passasse, ficam tão atrapalhados quando lhes peço que utilizem um registo cuidado, que o A.O. se torna um pormenor insignificante dentro desse grande problema que é a sua dificuldade de expressão oral e escrita.
Devo ressalvar o facto de não serem todos - há sempre os alunos que nos surpreendem pela positiva, que nos ensinam, que nos calam a boca. Ainda hoje um aluno espanhol me ensinou uma palavra em português. Mas os que revelam dificuldades (e que o admitem, até, com tristeza e resignação) são cada vez mais, o que de resto não deve ser novidade para ninguém. Isto só prova que o meu trabalho é importante, ainda bem. Mas às vezes penso: antes não fosse...

4 comentários :

Joana Matos disse...

Penso que seria bastante interessante um post sobre como as redes sociais e a globalização no geral influenciam as pessoas no que toca ao uso correto do português :)
Obrigada!

Anónimo disse...

Alguém me poderá dizer uma frase com a expressão "se haver"?
Um post com a diferença entre "se haver" e "se houver" era interessante, pois muitas das pessoas mais velhas da zona de Aveiro dizem "se haver" em vez de "se houver", por exemplo: "Vai à loja. Se haver leite compra 2 embalagens."

S. Leite disse...

Confesso a minha total ignorância relativamente a esse uso regional (Aveiro) do infinitivo com valor de futuro do conjuntivo. Presumo que se aplica a outros verbos, mas sinceramente não vejo que possa ser considerado correcto, em português padrão, construir uma frase com essa sintaxe ("se haver leite, compra"). Julgo que se trata de uma situação semelhante ao uso das formas "váiamos" e "dêiamos", igualmente incorrectas mas frequentes em certas localizações geográficas.

Anónimo disse...

Realmente também é comum ouvir "váiamos" e "dêiamos". As pessoas mais idosas é que costumam falar assim incorretamente. Em todas as regiões se podem ouvir algumas palavras mais estranhas como as referidas anteriormente.