Muita gente complica.
Dizem que a língua portuguesa é traiçoeira, que engana, que é difícil, e por aí fora. Mas a verdade é que não são raras as vezes em que somos nós, os falantes, que atraiçoamos a própria língua.
Hoje o Jaime alertou-me para o facto de haver quem diga virtualidade em vez de virtude. Não me surpreendeu, uma vez que é frequente as pessoas optarem – sobretudo em contextos formais – por palavras mais compridas, mais “bem sonantes”, mas que afinal não significam aquilo que elas pensam e por isso tornam o discurso incorrecto ou até incoerente.
Virtualidade é a qualidade daquilo que é virtual, ou seja, potencial, possível, ou ainda simulado (por oposição a real); a virtude é uma qualidade moral positiva, por oposição a um defeito. Assim, será muito pouco provável haver um contexto em que ambas as palavras possam ser usadas como sinónimas. Vejam, por exemplo, o resultado de trocar uma pela outra nestas frases: “estamos a entrar numa era em que a virtualidade assume a mesma importância que o real” e “a honestidade continua a ser considerada uma virtude”.
Uma confusão semelhante ocorre com os termos referir / referenciar e notar / denotar, que também não têm o mesmo significado, mas que muitos falantes usam alternadamente, como se tivessem, consoante a formalidade da situação.
A propósito, aqui há dias ouvi um comandante de bombeiros a dizer na TV que as vítimas de um acidente "se encontravam em estado de óbito".
ResponderEliminarPossidónio não?
Lol, para o estado de óbito.
ResponderEliminarEu, em garota, chamava a um dos meus irmãos "estúpido, estupendo, estupefacto!"...
Nunca ouvi ninguém dizer virtualidade em vez de virtude mas quando ouvir, se ouvir, já sei :p essa do óbito também foi boa :D
ResponderEliminarObrigado, Tikka. :-)
ResponderEliminarJaime
www.blog.jaimegaspar.com
Deprofundis, essa do «estado de óbito» é linda. Acho que há uns tempos alguém disse algo como «o cadáver foi encontrado já morto.»
ResponderEliminarJaime
www.blog.jaimegaspar.com
E já houve quem se referisse várias vezes, num trabalho para a minha disciplina, à "Vila de Óbitos"! Francamente...
ResponderEliminarA "Vila de Óbitos" é o cemitério. :-)
ResponderEliminarJaime
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Sara,
ResponderEliminarEm relação aos contrários, diria mais que o antónimo de "virtude" será "vício". O contrário de "defeito" será "qualidade". Acho isto porque "virtude" pressupõe um hábito (bom) e não uma qualidade circunstancial; tanto como vício será um hábito (mau).
Força com o blogue!
antónio
Obrigada pelo contributo, António! Mas se pensarmos em virtudes e defeitos enquanto características morais, não há nada que obrigue a que sejam circunstanciais. No meu entender, nem sempre as virtudes estão associadas a hábitos.
ResponderEliminarVer preâmbulo do Decreto-Lei n.º 140/2009 de 15 de Junho.
ResponderEliminarInfelizmente o fenómeno não se verifica apenas com a palavra virtude, agora cada vez mais substituída por 'virtualidade'.
ResponderEliminarTambém os locais deixaram de ter bons ou maus acessos para terem boas ou más acessibilidades, quando se deveria dizer que a acessibilidade é boa ou má em virtude de ter bons ou maus acessos.
Na mesma linha, deixou de falar-se em famílias com ou sem posses para se preferir dizer famílias com ou sem possibilidades.
Em arquitectura também não se colocam árvores nas maquetes, mas sim 'elementos arbóreos'.
Ouvi a Secretária de Ação Social de minha cidade dizer em uma entrevista:
ResponderEliminar"...aquelas gestantes que estiveram grávidas, favor procurar..."
;) Acontece...!
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